Não, esse blog não é sobre isso. Eu sei. Nem pretendo torná-lo em um blog de assunto diverso que não a nossa vida na Austrália. Mas hoje estava lendo um texto e me peguei pensando em mais uma diferença de realidade desde que nos mudamos pra cá.
O texto é esse aqui: http://papodehomem.com.br/como-se-sente-uma-mulher/ e faz uma reflexão sobre o preconceito diário sofrido pelas mulheres de uma forma geral, simplesmente pelo fato de sermos mulheres. O ponto que me chamou atenção pra trazer aqui pro blog é quando no início a autora relata casos de assédio na rua, tão comum no Brasil (e em muitos outros países também, claro, me lembro que quando fui pros EUA quando tinha 17 anos passei algumas situações bem constrangedoras nas ruas de Nova Jersey). Seguem trechos do texto:
“Aconteceu ontem. Saio do aeroporto. Em uma caminhada de dez metros, só vejo homens. Taxistas do lado de fora dos carros conversando. Funcionários com camisetas “posso ajudar?”. Um homem engravatado com sua malinha e celular na mão. Homens diversos, espalhados por dez metros de caminho. Ao andar esses dez metros, me sinto como uma gazela passeando por entre leões. Sou olhada por todos. Medida. Analisada. Meu corpo, minha bunda, meus peitos, meu cabelo, meu sapato, minha barriga. Estão todos olhando.
Aconteceu quando eu tinha treze anos. Praticava um esporte quase todos os dias. Saía do centro de treinamento e andava cerca de duas quadras para o ponto de ônibus, às seis da tarde. Andava pela calçada quase vazia ao lado de uma grande rodovia. Dessas caminhadas, me recordo dos primeiros momentos memoráveis desta violência urbana. Carros que passavam mais devagar do meu lado e, lá de dentro, eu só ouvia uma voz masculina: “gostosa!”. Homens sozinhos que cruzavam a calçada, olhavam para trás e suspiravam: “que delícia.” Eu tinha treze anos. Usava calça comprida, tênis e camiseta.
Agora, multiplique isso por todos os dias da minha vida.
Sei que para homens é difícil entender como isso pode ser violência. Nós mesmas, mulheres, nos acostumamos e deixamos pra lá. Nós nos acostumamos para conseguir viver o dia a dia.”
Eu sempre achei desagradável essa mania de alguns homens de fazerem cantadas agressivas, olharem ostensivamente como se a mulher fosse um pedaço de carne, fora casos bem mais graves de assédio e abuso sexual (em maior ou menor grau) que a grande maioria das mulheres já sofreram e acabam achando “natural”. Não, eu nunca achei isso natural, mas devo reconhecer que só agora depois de estar morando na Austrália há mais de um ano é que vejo com mais clareza que esse comportamento não é natural, tampouco aceitável, e que é sim possível se viver numa sociedade mais igualitária e respeitosa.
Claro que não vou dizer que a Austrália é perfeita, que não há crime, especialmente os de caráter sexual. Me lembro bem que antes de mudar pra cá uma professora de inglês minha que era australiana sempre dizia que se por um lado no Brasil ela ficava com medo de andar na rua e ser assaltada, na Austrália o medo dela era de estupro, que tinha índices altíssimos por essas bandas. Eu nunca ouvi histórias desse tipo aqui como se fosse uma coisa rotineira, mas ela me garantia que existia e ela morou a vida toda na Austrália (em várias cidades, então talvez essa percepção varie de cidade pra cidade).
Então pode ser que a minha percepção esteja errada, mas eu me sinto infinitamente mais segura aqui. E quando digo segura não estou falando de assalto (isso é assunto pra outro post), mas de violência sexual contra a mulher. Isso começa nas pequenas coisas, como andar na rua sem ouvir grosserias, ou mesmo receber olhares acintosos. E não importa se a mulher esteja de decote, roupa curta (olha que saia estilo cinto de tão curta é ainda mais comum aqui do que no Brasil), o respeito vai ser o mesmo.
Claro que acontece algum assédio na rua, principalmente se for num bairro conhecido por ser mais machista (um dia falo sobre isso), ou tarde da noite quando todos os bêbados e loucos saem as ruas, ou ainda em bairros mais “boêmios” e “perigosos” (nada perto dos padrões brasileiros, claro) a noite. E claro também que as pessoas paqueram em bares, boates, etc.
Mas de uma forma geral ando na mais absoluta segurança. Já peguei ônibus tarde da noite em que ao entrar só tinha homem dentro, já passei em meio a mil obras na rua, enfim, situações em que no Brasil seria “natural” ser assediada de forma agressiva e aqui não acontece, não rola nem uma olhada acintosa. Isso dá uma sensação de segurança que talvez os homens não consigam entender. Como disse a autora do texto que mencionei, talvez seja difícil para os homens compreender essa questão: “E você, leitor homem? Quando é abordado de forma hostil por um estranho na rua, pensa “por favor, não leve meu celular” ou “por favor, não me estupre”?”.
Não digo com isso que na Austrália não haja preconceito contra as mulheres, mas vejo uma sociedade bem mais igualitária. Talvez a ausência de assédio nas ruas não tenha a ver com a igualdade feminina em si, mas com a forma respeitosa com que os australianos tratam os outros de uma forma geral. No estilo “o meu espaço termina quando começa o seu”, todo mundo pede licença e diz por favor, espera o outro saltar do ônibus/trem antes de embarcar, ninguém parece ter a pressa absurda dos brasileiros pra ser o primeiro a ser atendido, a gentileza está sempre em primeiro lugar.
Sonho que um dia o Brasil possa ser assim, nós brasileiros só teríamos a ganhar com uma mentalidade ao estilo do Profeta Gentileza.
Que legal!! Eu e meu marido estamos indo pra Australia (Melbourne inicialmente) em setembro para estudar inglês... E nao vejo a hora de conhecer todas essas características de gente educada da Austrália que vejo nos blogs...
ResponderExcluirQuem dera um dia o Brasil conseguisse chegar à esse nível... Pena que acho meio impossível! Triste, né?! :(
Narjara
Oi Narjara! Vc vai conhecer, fique tranquila. :-)
ExcluirBoa sorte nos seus preparativos!
Bjs,
Denise